sexta-feira, janeiro 27, 2012

estranho - amigo - estranho. O ciclo da vida


A F. foi uma amiga de infância.
Não foi de longe a mais chegada, mas crescemos juntos, passámos pelos anos de conformismo infantil e pelos de rebeldia adolescente, e éramos peças presentes no cenário um do outro. Vi as suas “fases” passarem a velocidade supersónica e ela aturou as minhas (como o fiz com todos os amigos)
Estávamos juntos grande parte do tempo, e os pais dela já se tinham habituado à nossa presença pela casa. Fizemos todos projectos – como manda a norma - na altura da universidade, de irmos para a mesma faculdade, e ficarmos na mesma cidade e todo um chorrilho de divagações muito típicas de pessoas que não sabem mesmo o que querem da vida.
Há 4 anos a F. foi viver para Lisboa, e eu – bem como os restantes amigos mais chegados – fiquei por cá no Algarve. Não tivemos nenhuma divergência grave de opiniões, não deixámos de nos dar bem, e nem houve uma despedida atribulada.
Levou a mala cheia de roupa e a cabeça cheia de sonhos, e no processo, resolveu afastar-se.
Cansou-se de nós, o seu grupo de amigos de sempre.
E se querem que vos diga, é uma coisa muito desagradável.

Quero que percebam que não estou a querer de modo algum pintar a F. como a vilã nesta história, até porque deixei de a ver como tal há muito tempo atrás.
Acho que não há vilões nesta história, nem coisa que se pareça.
Sofremos de síndroma do membro ausente, estávamos demasiado habituados a que a F. fosse a “nossa F.”, e vê-la fugir-nos foi no mínimo estranho, e levou imenso tempo a ser processado.
De uma forma muito gradual, a F. foi fugindo das nossas vidas, deixando de ser uma figura presente e passando a ser uma memória muito evocada.
Durante muito tempo tentámos dar o desconto. Tentámos incluí-la sempre que possível...
Mas a F. não queria. Esquivava-se, dava desculpas, ou “perdia o telemóvel” ou “não tinha os nossos contactos” ou “não tinha internet”, e ficava invariávelmente incontactável até ter necessidade de se sentir novamente integrada e se vir juntar a nós pelo meio de milhões de desculpas e promessas de “um cafezinho” ou dois, que nunca passavam disso mesmo, acho que nos tomou por garantidos.
E de um momento para o outro estivemos mais de um ano sem ouvir dizer nada da F. eclipsou-se totalmente.

Ora, na teoria é muito bonito dizer que a distância não abala uma amizade, mas isso não funciona assim na prática.
Por demasiada boa vontade que haja por parte de toda a gente, a dada altura dá-se o click.
E aqui reside o mito comum de que o click se vai dar de forma audível. Que um dia qualquer acordamos e ouvimos um BOOM na cabeça e que isso quer dizer que A, B ou C perderam o lugar,
Acho que no fundo esperávamos todos que esse dia não chegasse, por muito magoados que estivessemos com a F. e com a maneira como nos tratou.
Mas ele chegou e não deixou mensagem.
Passado mais de um ano sem sequer por a vista em cima da F. ela reapareceu, sem qualquer tipo de justificações, e inseriu-se no nosso grupo como se nada fosse.
E se querem que vos diga, foi o momento mais constrangedor da minha vida até hoje.
Algures pelo caminho, a F. deixou de ser nossa amiga.
Toda aquela empatia que se foi desenvolvendo ao longo dos anos, gastou-se com os golpes de indiferença e a cumplicidade era menos que nula. Não tive vontade de lhe contar nada da minha vida, nem consegui desenvolver uma conversa com ela que passasse do estado do tempo - e não fui o único.
Ela passou de amiga a desconhecida.
E não era má vontade, rancor ou mágoa, como eu esperava vir a sentir.
Resumidamente... não era nada. É como quando vamos ao pote do café a contar que esteja cheio, e ele está vazio, e tiramos uma colher cheia de ar.
E enquanto estávamos todos num bar a conversar e a rir e a F. ficava a um canto sem se conseguir inserir, por ter simplesmente perdido o lugar – voluntariamente – não consegui deixar de sentir pena dela.


Vivemos à base de engrenagens, que giram em diversas velocidades muito próprias.
Vejo cada engrenagem como uma pessoa que conheço, e a velocidade com que roda determina em que fase nos encontramos. Nem todas são essenciais para o funcionamento da máquina, e eventualmente algumas deixam de funcionar.
Não chegam a ser substituídas, são apenas removidas.
A F. é uma dessas engrenagens, que decidiu deixar de funcionar e agora deixou de ter lugar na minha máquina.

E vocês?
Já tiveram alguma F. nas vossas vidas?
Vá, hoje não tenho grandes perguntas. toca a ler comentar subscrever etc. etc.

9 comentários:

  1. Escreveste aquilo que sempre pensei ao longo dos últimos tempos :x
    Já toda a gente teve, ou tem, uma F. :)

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  2. Entendo bem o que é isso, porque aconteceu comigo, com duas amigas que tive (embora elas se considerem minhas amigas, já não sinto mais assim) o tempo, a ausência embora digam que não, acabam por desgastar, estragar .. uma amizade.
    É uma pena .. mas acontece .. é a vida . . por mais que pensamos que vamos conseguir levar aquela amizade pelo resto da vida, os acontecimentos, sejam quais forem .. podem destruir tudo.

    Tenha um ótimo fim de semana!

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  3. Sem dúvida que tenho uma F., mas não nesses parâmetros, mais como alguém que tanto quis acreditar que nada é eterno que foi estragando as relações que tinha com as pessoas que se preocupavam. Por acaso ando há algum tempo para escrever um post em relação a isso, mas quis deixar passar algum tempo para não ter comentários inflamados...

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  4. Infelizmente todos temos uma F. Eu tenho mais que uma... Acho que o problema não é distância por si só. Se a distância pode, efectivamente, prejudicar uma amizade, acho que quando existe realmente vontade que esta prevaleça, arranjam-se formas de ultrapassar esse "pequeno" problema. O problema é o que as pessoas fazem dessa distância, é o facto, precisamente com disseste que a F. fez convosco, de as pessoas tomarem os outros como garantidos. Pode não dar para duas pessoas se encontrarem mas, caraças, com tantos meios de comunicação, a falta de presença física é ultrapassável.
    Nas minhas Fs o problema não foi tanto a distância geográfica. Foi mesmo a distância "psicológica", alteração de interesses onde não cabiam aqueles que outrora tinham sido grandes amigos. E, infelizmente, sei que hoje as coisas não poderiam voltar a ser como eram antes.

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  5. Penso que toda a gente tem ou teve uma F. na sua vida. Quem não teve muito provavelmente virá a ter, eventualmente.
    Neste momento eu tenho uma F., F. essa que preferia não ter por ser a pessoa a quem confiava a própria vida. Mas parece que a vida é mesmo assim e, por vezes, a nossa F. é quem menos esperavamos que viesse a sê-lo

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  6. Tive uma grande amiga que se casou com um Sueco e foi morar na Suécia. No início a coisa ainda funcionou, mas depois ela também se desinteressou. Na última carta que recebi dela, disse que sua vida tinha mudado muito e que tinha novos amigo. Acho que entendi o recado... rs.

    Obrigada pela visita!

    Beijocas

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  7. Manteiga
    Quer dizer que não estou a falar mentira nenhuma xD. Infelizmente há Fs para dar e vender xD.

    Ana Narvaz
    Acho meio diferente quando é por causa de desgaste do tempo só. é bem chato também mas é diferente.
    Eu sou muy crente e acabo esperando muitas vezes o melhor das pessoas... daí me ferro, xD.

    Afal
    Tamos quites que nesses moldes nunca apanhei ninguém. Acho melhor deixares esfriar um bocadinho sim, porque passado um tempinho vemos as coisas de uma perspectiva mais calma, é mais fácil falar disso nessa altura.

    B.L.
    Pois, eu também não vejo a distância como uma desculpa completamente fiável hoje em dia, só a distancia emocional,mas quanto a isso não há grande coisa a fazer.
    Curiosamente quando as pessoas "mudam" muito e nos afastamos, não me custa tanto, é chato mas parece me mais natural :(

    NiSousa ☮
    A minha F. não era minha melhor amiga. era próxima mas não nos dávamos assim tão bem. a melhor amiga dela é que andou pior que estragada uns tempos porque passou pelo que eu passei e por mais um bocadão.

    Dama de Cinzas
    Ai que mau pah, bem, parecendo meio cliché talvez tenha o seu quê de verdade,se não estava interessada, não valia a pena.

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  8. Todos temos uma F. nas nossas vidas... Às vezes até mais que uma...

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  9. Tânia
    Pelos vistos parece que sim... :/

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